Em Yoga Clássica ou Yoga de Patanjali, ciência que demonstra a potencialidade da alma humana, há oito passos a completar, envolvendo disciplinas tanto físicas quanto mentais. Na primeira destas etapas, se acham disciplinas relativas à auto educação ou auto-controle, tais como: não violência (ahimsa), veracidade (satya), continência (brahmacharya), etc. Na etapa seguinte, as chamadas ‘observâncias’, estão a prática de pureza, contentamento, esforço sobre si mesmo, estudo e consagração ao Ideal. O terceiro passo, ou 3ª pétala de Yoga, trata das posturas ou âsanas, isto é, os modelos gestuais recomendados aos que aspiram algum domínio sobre seu corpo. A quarta etapa é dos pranayamas, ou seja, as disciplinas necessárias ao controle da energia através da respiração. Pratyahara é a etapa em que se aprende a controlar os sentidos. Dhârana, a 6ª etapa, se ensina a concentração da atenção. O 7º passo, denominado Dhyâna, diz respeito às técnicas de introspecção, ou de meditação, e o último degrau, que na verdade é um patamar, denomina-se Samadhi, ou absorção completa no Ideal Espiritual.
Nosso intuito aqui é falar um pouco sobre o 7º passo, dhyâna, ou como conhecemos aqui no ocidente, meditação, uma vez que este termo está em moda, muitas práticas sendo fornecidas em nome de meditação. Dhyâna, significa de fato ‘estar desperto’ ou ‘estar alerta’, não apenas em determinados momentos, mas, seguidamente, continuadamente. Dhyâna não significa, com efeito, entrar em algum estado subjetivo, ou maravilhoso, mas, simplesmente, ficar consciente da Realidade em si mesmo, podendo ver, o tempo todo, as diferenças entre o que é real e o que não é!
Temos de dizer ainda que Dhyâna não é algo a ser feito de modo isolado, ou seja, excluindo-se as etapas anteriores. Os passos prévios, como em qualquer seqüência, são como que preparatórios aos seguintes, cada vez mais sutis e delicados. Não se alcança êxtase ou samadhi, sem o devido preparo, sem a devida queima de tudo que há de acessório na mente. Como em todo ramo da Ciência, não se pode compreender a lei da Relatividade de Eisntein, sem antes haver entendido, por exemplo, a lei de causa e efeito, tão presente na vida.
Hoje em dia queremos todos obter imediatos resultados, não queremos passar por nenhum processo, desejamos pular logo para o desfrute dos efeitos, que são mais efetivos e fáceis. Alguém lê um ou dois livros sobre tal assunto e já quer oferecer um curso e dar diploma! Não é uma atitude inteligente, é apenas conveniente imediatismo, que cedo ou tarde irá ser desvendado.
II. De modo que, em Yoga, que é a ciência da consciência, não se recomenda pular etapas, mas procurar desenvolver as coisas em harmonia.
Trata-se, isto sim, de definir um determinado modo de vida, com disciplinas morais, físicas, mentais e intuitivas, resultando no completo desabrochar de todas as possibilidades intrínsecas à mente, desde a mente não educada, ao pensamento dito racional e daí até o não-pensamento.
O símbolo deste movimento rumo à perfeição é a ‘flor de lótus’, que possui raízes no lôdo, mas tem suas pétalas, da mais completa beleza, abertas para o infinito. Este Lótus, que simboliza a consciência ‘consciente de si mesma’, é representado com 8 pétalas, os oito passos ao aprimoramento integral.
Qual é, porém, a meta de Yoga? Vamos colocar esta questão fora de qualquer didatismo ou mesmo erudição. Com simplicidade poderia ser dito que é ampliar a visão e a perspectiva humana, criando uma mente firme e equânime. Uma das definições de Yoga, encontrável nos livros antigos, é ‘a arte de agir de modo desapegado’, ou seja, com a mente nivelada: samatvam yoga ucyate, é a expressão em sânscrito. Em Yoga não se recomenda o não-agir, mas o reto-agir. Como? ao se desenvolver as capacidades latentes na mente, nos oito passos já ditos e alcançando a arte de se manter, com relação ao jogo de dualidades da vida objetiva, de modo nivelado ou equânime. Venha o que vier, aconteça o que acontecer, sua mente permanece estável.
No capítulo 2 da Bhagavad-Gitâ, Sri Krishna está ensinando seu discípulo Arjuna, a arte da ação desinteressada de resultados:
“Estando firme em yoga, oh Arjuna, atue sem apego, permanecendo indiferente tanto ao sucesso quanto ao fracasso. Esta estabilidade da mente é conhecida como yoga.”
Aqui a palavra yoga surge novamente. O que é yoga? Yoga é samatvam, ou seja, equanimidade, mente em equilíbrio perfeito, isto é chamado yoga.
‘Renunciando ao apego’ proveniente do eu não evolvido. Todo apego provém desta pequena pessoa, portanto, deve desaparecer, mas como isso acontece? Ao negar este pequeno ‘eu’, o ‘eu’ maior começa a se manifestar. Quando o ‘eu’ imaturo se vai, o ‘eu’ maduro se apresenta. Assim sendo, ‘considerar iguais tanto o sucesso quanto o fracasso’. Não é apropriado ficarmos muito deprimidos diante do fracasso, nem muito alegres com o sucesso. Portanto, ‘tente manter sua mente tranqüila’. (Comentários do livro “Universal Message of the Bhagavad-Gitâ”, edição Advaita Ashrama, Índia).
III. Há quatro tipos principais de Yoga a considerar, dependendo da natureza de cada um: a) bhakti yoga: é a atitude da devoção, em que o aspirante se considera como um servidor de Deus, oferecendo a Ele suas ações e pensamentos;
b) karma yoga: é a atitude em que o aspirante desenvolve ação desinteressada, ele é um instrumento e não se incomoda com os resultados;
c) jñana yoga: é a yoga do conhecimento, apropriada aqueles aspirantes de natureza intelectual, que fazem perguntas e vão em busca de respostas;
d) raja yoga ou yoga real: caminho em que se desenvolve o direto controle sobre a mente e os poderes psíquicos.
Estas atitudes podem ser encontradas, em verdadeiros aspirantes, todas de uma vez. Porém, o normal é que saibamos qual nossa atitude preponderante e, depois, de forma harmônica, sejam desenvolvidas as demais.
Em Yoga se aprende também que a mente é portadora de tendências herdadas ou qualidades, denominadas ‘gunas’, que são de três classes:
tamas: é o conteúdo mental que caracteriza a inércia, a preguiça e a indolência;
rajas: do mesmo modo, ao contrário de tamas, é o que leva aos excessos:
sattwa: é o elemento que conduz à ponderação, ao equilíbrio e harmonia, e ao conhecimento da verdade sobre si mesmo.
É claro que aqui estamos oferecendo apenas breves considerações, alguns traços preliminares para quem desejar estudar ainda mais.
Considera-se que o aperfeiçoamento do homem se completa ao transitar sua mente desde tamas, por rajas, até sattwa. Do homem comum, ao intelectual, até o homem cósmico ou integral. Este é o processo pelo qual podemos despertar e realizar o que há de melhor em nós mesmos, as sementinhas do Universo.
IV. Portanto, a idéia de ‘meditação’ é bastante antiga, incluída que está em uma tradição que ostenta mais de 6.000 anos de conhecimento, de averiguação e de auto-sustentação, e tudo, em qualquer dos sistemas de pensamento e filosofia, está baseado na verificação intuitiva, através da meditação!
Porém, aqui no ocidente, não se conhecia nada disso até bem pouco tempo atrás. A educação psicológica foi sempre desvalorizada, dando-se preferência à educação apenas operativa, fornecedora de ferramentas para o sustento do corpo e nada para o aprimoramento mental. Nas igrejas se ensinou sobre os pecados capitais, sobre vergonhas e culpas; confissões, orações, medos; Deus e o diabo! Falou-se muito em perdão e arrependimento, mas nada foi dito sobre algum meio de harmonizar as tendências inatas, e crescer interiormente.
Nos mosteiros, aqueles monges que viviam experiências mais reclusas, podiam falar em ‘meditação’, e em algumas das tradições mais ascéticas, chamadas ‘dos pés descalços’, a vida contemplativa deveria se harmonizar, de fato, com a vida ativa.
Um monge beneditino ou trapista, por exemplo, poderia recomendar a um devoto a meditação em textos consagrados ou em certas frases, que inclinassem à submissão e ao arrependimento.
Alguns destes monges obtiveram de suas Ordens autorização para uma visita ao Oriente, tanto à Índia quanto ao Tibete, como aconteceu no caso de Thomas Merton, escritor e pensador trapista que relatou passagens de sua viagem no livro, bastante conhecido, “O Diário da Ásia”, que não chegou a concluir: após visitar Darjeeling, Calcutá e Madras, veio a falecer vitima de um choque elétrico, no mosteiro em que se hospedava, no ano 1.968, em Bankoc, na Tailândia. Era tão apaixonado pela Índia, que ao sobrevoar Calcutá, escreveu o seguinte:
‘É uma cidade que eu amo! O vôo de hoje foi lindo. Não me refiro à beleza bizarra e macabra das favelas, ao antigo esplendor perdido. Falo da beleza sutil dos açudes suburbanos e dos pomares, homens que solenemente se banham de manhã cedo e de garças brancas muito lindas e quietas, de pé entre os lótus, ou voando. Também a cidade, com seus muros em ruínas avivados por inscrições em bengali!’
V. Dois outros monges beneditinos me acorrem à memória, por terem vivido na Índia e haverem se misturado aos costumes e tradições religiosas locais. Um deles, do qual não me recordo o nome monástico, adotou tanto as maneiras hindus, como também um nome apropriado – Swami Abhikshitananda. Outro foi um frade, Bede Griffiths, que viveu por lá desde 1.955 até ’68, tendo inclusive fundado um ashram, ou mosteiro, no estado de Tamil Nadu. Griffiths escreveu em seu livro “O Retorno ao Centro”:
“Além de ser cristão, eu preciso ser um hindu, um budista, um muçulmano; um sikh, jainista, zoroastrista e judeu. Só assim poderei conhecer a Verdade e encontrar o ponto de reconciliação de todas as religiões... É esta revolução que tem de se processar na mente do homem ocidental.”
São muitos os exemplos de ocidentais que tiveram suas vidas inteiramente modificadas após haverem visitado a Índia. Vamos citar apenas os ‘pontos culminantes’! Um outro nome bastante conhecido é do escritor e jornalista inglês Paul Brunton, que em seu livro mais famoso “A Índia Secreta”, edt. Pensamento, relata suas conversas e seu despertar espiritual no contato, não muito prolongado, com o sábio de Arunachala, montanha sagrada ao sul da Índia, Sri Ramana Maharshi:
VI. Todavia, esta transferência de conhecimento espiritual até onde nos é possível verificar, teve início em 1.893, com a chegada ao “Parlamento das Religiões”, em Chicago, do Swami Vivekananda proveniente da Índia.
Nossa mente prática tem-se voltado para o Oriente em busca de inspiração e perspectiva espiritual. Temos nos sentido desorientados, sem novas idéias e diretrizes, padecendo de fome e sede de saber. Mas... por onde começar, como dar o primeiro passo?
Há um antigo ensinamento que poderia ser assim resumido:
Buscar a solidão pode ser tanto um convite , que se pode aceitar ou não, ou um verdadeiro chamado , que o levará, de fato, a buscar algum tipo de solidão ou de retiro. Todos os bons e experimentados buscadores conhecem este chamado. Ou, deveríamos dizer, “exploradores”?
Swami Vivekananda era um destes grandes, extraordinários exploradores. Porém, ao contrário dos desbravadores convencionais, que procuram riquezas e bens materiais, ele nos veio trazer “ LUZ espiritual” !
Basta dizer que ele apenas completara 30 anos, quando, impelido pelas condições culturais que o cercaram na época, 1893, deixou sua pátria, a Índia, em demanda da América, afim de participar de um grande encontro inter-religioso na cidade de Chicago, o Parlamento das Religiões, como representante da sabedoria dos antigos rishis hindus.
No momento em que Swami Vivekananda desceu do navio à vapor ‘Express of India’, que o trouxe à “terra prometida”, o grande cisne da sabedoria antiga, a filosofia Vedanta, iniciava seu vôo de reconhecimento ao ignoto continente americano.
Como sabem os estudantes do ensinamento de Swami Vivekananda, seus primeiros passos na América desconhecida e distante, foram inteiramente gloriosos. Tornou-se uma celebridade, da noite para o dia, e, como tal, seguiu-se uma longa série de compromisso, envolvendo adaptações, viagens, palestras públicas, programas de classes, etc.
Em particular ou em público, a tônica das conversações de Swami Vivekananda foi sempre “como encontrar e realizar nossa natureza Divina”.
É esta a idéia fundamental de seus ensinamentos: “ENCONTRE DEUS! NADA MAIS IMPORTA !”
Um límpido e claro horizonte, drapejado de liberdade, estava sempre diante de seus olhos. Que outra razão haveria para viver, senão para alcançar a glória da auto-realização ?
Há uma obra do novelista americano Ernest Hemingway que marcou época: “Por Quem os Sinos Dobram...” !Em determinado trecho da novela, ele diz: “- Não pergunte por quem os sinos dobram. Eles dobram para você !”
Da mesma forma, não pergunte para quem soam os “gonzos e címbalos” do Swami Vivekananda, tocados do alto das vertentes brancas dos Himalayas, desde há 120 anos passados . . . soam apenas para você !
HARI OM TAT SAT VIVEKANANDA .